Belo Horizonte

Explorando o som único e a genialidade de Roger Deff

📷 Paulo Oliveira

Roger Deff é um rapper que começou a fazer barulho nos anos 90, com o Julgamento, uma banda que lançou discos como “No Foco do CAOS” (2008), “Muito Além” (2011) e “Boa Noite” (2018).

Ele já tocou e gravou com vários nomes da música brasileira, como Marku Ribas, BNegão, Marcelo Veronez, Rodrigo Borges, Tamara Franklin, Cromossomo Africano, Radical Tee, Dokttor Bhu e Shabê, entre outros.

Em 2015 ele decidiu seguir um caminho mais pessoal e soltou os singles “Pro combate” e “Segue o Fluxo”, produzidos por Daniel Saavedra. Essas músicas mostravam a sua personalidade e o seu estilo, e foram o ponto de partida para o álbum “Etnografia Suburbana”, o seu primeiro trabalho solo, de 2019, seguido de “Para Romper Fronteiras” de 2021.

Roger conta pra gente, com muita simpatia, como foi que ele se apaixonou pela música desde cedo, quais artistas e estilos marcaram sua trajetória e como ele enfrentou os perrengues que apareceram pelo caminho, sem perder o bom humor e a criatividade.

1. Como você se envolveu pela primeira vez com o hip hop e a música?

É bom, eu me envolvi com hip-hop e rap, me envolvi, gostei, curti a vibe, achei que era o caminho que eu queria seguir, um vizinho meu na verdade. Mas aquela pegada me chamou muito a atenção, foi muito impressionante, sabe? Não era mais da minha cabeça e fiquei com uma vontade muito grande de continuar ouvindo mais aquela música. Eu vi um cara negro como eu, envolvido com uma arte, com uma coisa que eu não entendia o que era naquela época, eu não sabia o que era, nem sei se ele mesmo entendia exatamente o que era, mas eu comecei a entender o que eu gostava de música. Então, eu comecei a pedir fitas. Bom, ninguém emprestava discos nessa época. Um ou outro às vezes emprestava alguma coisa, mas era bem difícil ter acesso às músicas, tinha essa dificuldade. 

Queria ter acesso às músicas que tinham uma relação com esse tipo de música, né? E então, um dia, meu primo, Rodrigo Pelé – membro do Black Soul – que foi o primeiro grupo de rap a gravar em Belo Horizonte – começou a me levar discos, como James Brown, mas eu nunca consegui me conectar com James Brown quando ele estava em casa, sabe? Então ele trouxe o disco do Black Soul, que é o álbum do grupo de rap dele. Meu pai já havia me mostrado uma foto dele no jornal e fiquei muito empolgado em ver meu primo no jornal. Então conversei com ele sobre como eu também queria fazer rap. Ao mesmo tempo, tinha pessoas no bairro que já faziam rap e eu queria fazer parte disso, me envolver, então foi um pouco disso. Depois disso, criei meu próprio grupo e já estava ativo no rap durante a metade dos anos noventa. 

2. Quais foram as principais influências na música e no seu estilo?

Noventa e três foi o ano em que comecei a me aproximar dessa música, noventa e dois, noventa e três. Noventa e cinco fazendo minha primeira apresentação. São os anos em que tem Gabriel Pensador chegando até o primeiro disco. Houve uma popularização do rap no Brasil. E sai o disco Racionais MCs Raio X do Brasil, que é um discasso!  Pessoas que me ajudaram muito lá no bairro, foi Moab, que foi o cara que foi o primeiro MC que quis fazer grupo comigo. O Alexandre, então ele me incentivou muito a montar meu grupo de rap e foi me aplicando muita coisa. Então minha escola básica de rap é muito em cima do rap brasileiro, muito conectada ao rap norte-americano. 

Ainda respondendo à segunda pergunta sobre influenciadores, é importante mencionar também que existem influências do rap, mas eu acredito que também há influências que não necessariamente são do rap, como o caso de Michael Jackson. Eu acho que ele era uma influência até mesmo em relação à visibilidade negra, para mim. Mesmo que não tenha pensado muito nisso, ele era alguém que eu queria parecer de alguma forma, por causa do que ele representava, por ser o maior artista pop negro. Então, de certa forma, era uma maneira de me ver, eu me via nele. Estava conversando com um amigo meu hoje, sobre o papel que esses grandes artistas têm, de dar visibilidade às pessoas como nós, pessoas negras, nesse mundo que não nos vê representados pela mídia, pelos meios de comunicação. E nos espaços de poder. Então, Michael Jackson era um pouco esse cara dos meios de comunicação, da performance e de várias outras coisas que eu queria ser. 

3. Que desafios você enfrentou em sua carreira e como os superou?

Há vários desafios assim, né? Acredito que, primeiramente, meu primeiro desafio foi quando minha irmã nem sequer conhecia o grupo de rap Black Soul, do qual eu fazia parte, e ela ouviu minha música e me disse que não estava boa. Mas, mesmo assim, eu quis continuar porque vi que isso era importante para mim, já que tinha um disco gravado. Então, ouvi a Lili falar, e isso foi muito importante.

E o outro desafio é a profissionalização, né? Como nos tornamos profissionais nesse ramo? Como nos tornamos profissionais em uma época em que as coisas eram muito mais restritas? Era tudo mais difícil, que muitas vezes era até inóspito. Os artistas já estabelecidos vivem altos e baixos, e eu, como um artista independente underground de Belo Horizonte, imagina só? É uma luta constante para se manter, para manter os projetos ativos e continuar fazendo o que gostamos. 

Então, eu acredito que os desafios foram superados e acho que já conquistamos um espaço que era impensável. É importante reconhecer isso. 

Acho que além dos desafios, das conquistas também é importante falar um pouco do que foi alcançado, né? Eu vi meu som chegando em pessoas que eu nem imaginava Eu toquei na PUC hoje e uma pessoa do Paraná veio conversar comigo, dizendo que o pessoal escuta meu som lá. Então, isso era algo que eu não seria capaz, entende? Tinha a ver com isso e também teve momentos na minha vida que foram muito felizes.

Parcerias, por exemplo, gravei com o Rodrigo Borges, que é um grande parceiro. O Rodrigo me deu um presente que nunca vou esquecer, que foi me convidar para cantar no palco com ele, o Lô e o Milton. Escrevi uma trilha para o programa “Rolê das Gerais”, que é muito importante para as periferias. São coisas que o rap me trouxe e que eu nem poderia imaginar.

Até hoje, essas são coisas que não acontecem para as periferias de Belo Horizonte. Acho que é um piloto importante para pensar em um programa desse nível no Brasil. Fico muito feliz de ter um pouco disso aqui porque acho que é um ponto importante de ser abordado. 

4. Como Roger Deff descreveria o cenário do hip hop em Belo Horizonte?

Sabe, eu acho que ele tem se transformado a cada ano. Ele segue um caminho muito autônomo, é um hip-hop feito aqui pelas pessoas daqui, com o jeito que as pessoas conseguem interpretar essa cultura. Eu acho que hoje ele é reconhecido como um dos cenários mais importantes, com pessoas e coletivos como família de rua. Estou falando do Renegado, o nosso MC, MC da minha geração que tocou no mundo inteiro, em vários lugares. Com seu trabalho fez várias coisas legais e ainda está seguindo essa caminhada e produzindo muito. É uma inspiração para nós. Temos esses lugares assim. Muitos estão ganhando visibilidade, que têm esse reconhecimento e são vistos e percebidos com trabalhos aqui e em outras partes do mundo também. 

5. Quais são os próximos projetos ou colaborações que podemos esperar de você?

Sobre o meus próximos trabalhos eu vou lançar agora em em setembro eu vou lançar o primeiro single do meu próximo disco que é o disco vai se chamar Alegoria da Paisagem e o single é o single Amor pela  quebrada. É um disco em que eu tenho o meu bairro, o território da periferia, meu bairro Jardim Alvorada é o lugar ao qual eu me referencio nesse trabalho, né? E ele fecha o que eu chamo de trilogia, trilogia  que é a trilogia da periferia. Os dois discos anteriores já tinham esses diálogos, cada um de uma forma diferente.

O disco “Para romper fronteiras” é um disco calcado na cultura nesse lugar da cultura afro diaspórica urbana, que eu estava ali percebendo. Aí eu pego esse disco agora totalmente calcado na no conceito do território que é algo muito caro ao hip hop como um todo. No “Alegoria da Paisagem” trato este conceito da invisibilidade de determinadas paisagens. Falo da invisibilidade e da visibilidade. Com uma visibilidade que era chancelada pelas próprias pessoas que moram lá nesses territórios? Falo desse lugar e da periferia enquanto paisagem da cidade, enquanto paisagem vista e não vista e e consequentemente, obviamente, das pessoas que moram lá, que são desses lugares. O disco sai nas plataformas digitais dia 19 de outubro. É um disco em que homenageio meu pai – falecido no ano passado. O disco traz muito do da da narrativa, dessa construção do meu pai naquele território, lugar que ele construiu pra gente viver e tudo e que a gente passou a maior parte das nossas vidas ali.

Laís Eiras

👩‍🎤 Friendly pop culture guru. Web fanatic. General food specialist. 📧 lais@yeahrockmusic.com

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